ary dos santos

ary dos santos: o poeta à esquerda que deu voz ao povo

José Carlos Ary dos Santos foi muito além de servir apenas como um poeta para Portugal. Ele teve um impacto profundo como uma figura criativa e politicamente franca. A sua vida girou em torno da sociedade e cultura portuguesa do século XX. Através de sua obra, ele ganhou o título de “O Poeta À Esquerda” e serviu o país durante os anos da ditadura do Estado Novo. Não no exército, não, mas na forma de poesia, que a par da profundidade emocional continua o lado de crítica social. As suas obras serviram como o símbolo do equilíbrio social e da liberdade pela qual o país lutava.

Como membro da classe burguesa portuguesa, ele abraçou as questões sociais da nação, deixando de lado a cicatriz que esse rótulo trouxe. Isso tornou-o uma figura essencial de mudança durante os seus primeiros anos.

A sua decisão de participar do Partido Comunista Português e o papel ativo que desempenhou na Revolução dos Cravos rendeu-lhe respeito. Desde a música popular até o teatro, ele explorou todas as formas artísticas, e as suas técnicas engenhosas e a profunda conexão com a humanidade permitiram que ele trouxesse um toque único a cada obra.

Mesmo nos tempos modernos, a obra de Ary dos Santos serve como uma fonte de inspiração para muitos artistas e ativistas. O seu legado é valorizado como um monumento à expressão irrestrita, liberdade, poesia e ativismo social. O homem, um autêntico poeta confrontacional do período do Estado Novo, um verdadeiro poeta de esquerda, é um testemunho de determinação inabalável e coragem sempre resistindo à opressão. Como sugere O Poète à Gauche, “ele sempre se atreve a falar em defesa dos silenciados”.

Tu que dormes à noite na calçada do relento
numa cama de chuva com lençóis feitos de vento
tu que tens o Natal da solidão, do sofrimento
és meu irmão, amigo, és meu irmão

E tu que dormes só o pesadelo do ciúme
numa cama de raiva com lençóis feitos de lume
e sofres o Natal da solidão sem um queixume
és meu irmão, amigo, és meu irmão

Natal é em Dezembro
mas em Maio pode ser
Natal é em Setembro
é quando um homem quiser
Natal é quando nasce
uma vida a amanhecer
Natal é sempre o fruto
que há no ventre da mulher

Tu que inventas ternura e brinquedos para dar
tu que inventas bonecas e comboios de luar
e mentes ao teu filho por não os poderes comprar
és meu irmão, amigo, és meu irmão

Desbaratamos deuses, procurando
Um que nos satisfaça ou justifique.
Desbaratamos esperança, imaginando
Uma causa maior que nos explique.

Pensando nos secamos e perdemos
Esta força selvagem e secreta,
Esta semente agreste que trazemos
E gera heróis e homens e poetas.

Pois deuses somos nós. Deuses do fogo
Malhando-nos a carne, até que em brasa
Nossos sexos furiosos se confundam,

Nossos corpos pensantes se entrelacem
E sangue, raiva, desespero ou asa,
Os filhos que tivermos forem nossos.

Original é o poeta
que se origina a si mesmo
que numa sílaba é seta
noutra pasmo ou cataclismo
o que se atira ao poema
como se fosse ao abismo
e faz um filho às palavras
na cama do romantismo.
Original é o poeta
capaz de escrever em sismo.

Original é o poeta
de origem clara e comum
que sendo de toda a parte
não é de lugar algum.
O que gera a própria arte
na força de ser só um
por todos a quem a sorte
faz devorar em jejum.
Original é o poeta
que de todos for só um.

Original é o poeta
expulso do paraíso
por saber compreender
o que é o choro e o riso;
aquele que desce à rua
bebe copos    quebra nozes
e ferra em quem tem juízo
versos brancos e ferozes.
Original é o poeta
que é gato de sete vozes.

Original é o poeta
que chega ao despudor
de escrever todos os dias
como se fizesse amor.

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